quarta-feira, 11 de maio de 2011

Casa Ecologicamente Correta

O que seria jogado fora e estaria fadado a se perder na natureza e a degradar o meio ambiente toma ares de requinte e de novidade se reaproveitado. Na casa do professor de arquitetura Flávio Negrão, de 35 anos, lixo é sinônimo de coisa nova. Na propriedade do condomínio Vila Castela, em Nova Lima, na Grande BH, reciclagem começa do básico. Um coletor leva a água das chuvas das calhas até uma caixa com capacidade para 5 mil litros, de onde é distribuída para irrigação dos jardins, a limpeza e a máquina de lavar roupas. O resultado se reflete no bolso: ele paga a taxa mínima pelos serviços da Copasa.

A idéia de fazer diferente surgiu nos tempos da faculdade. “Comecei a pensar como poderia contribuir para reduzir o lixo”, conta. A partir daí, entrou em contato com várias pessoas da área para descobrir novos formatos e implementar os três erres: reduzir, reciclar e reutilizar – acrescidos, atualmente, por um quarto componente: o reeducar. Hoje, Negrão é uma referência em matéria de lixo. “Meu papel é multiplicar, não quero ficar milionário com idéias de reaproveitamento. Cada um pode e deve fazer a sua parte”, diz.

 

O desafio seguinte foi construir uma casa ecologicamente correta e com baixo custo. Garrafas PET são usadas para dividir os canteiros. A tinta para pintar a edificação foi feita com uma mistura que tem como base a própria terra da região. Para a mesa, foram reaproveitadas bobinas de fração elétrica, com a base de tubos de papelão. Os assentos das cadeiras foram revestidos com banners. Os armários, as portas, o teto e até mesmo o box do banheiro são de placas feitas com tubos de pasta de dente. “A reciclagem é o grande desafio do ano. Uma das ramificações é a água e um dos problemas são os resíduos. A redução deles é o início de tudo, pois as pessoas precisam entender que fazem parte do meio e devem realizar algo para melhorar esse ambiente insustentável que temos hoje.”

No condomínio da família do arquiteto Tarcísio Ribeiro, no distrito de São Sebastião das Águas Claras, conhecido como Macacos, o reuso da água também é lei. Os captadores pegam o produto das chuvas e abastecem uma caixa d’água de 45 mil litros feita de água e cimento. O processo é repetido em outros tanques espalhados pelo terreno. “É uma técnica barata que resolve dois problemas: a erosão do solo, pois as manilhas diminuem a velocidade da água que desce pela terra, e o consumo menor para irrigação”, afirma. Telhas feitas com embalagens tetra-pak e de tubos de pasta de dente são usadas em cinco anos nas coberturas de áreas e jardins da propriedade. O deck foi todo construído com cruzetas de postes de iluminação.

Para ele, consciência ambiental e coragem para trabalhar a novidade são fundamentais para aplicar os produtos reciclados em casa. “Temos vários produtos industriais que são disponíveis, mas que as pessoas não conhecem. Como mudar uma das coisas mais poluentes, que é a construção civil, se não houver inovação?”, questiona. O mais novo imóvel do condomínio, a casa onde ele vai morar, é o exemplo desse conceito. O muro de arrimo é todo de cimento, sucatas de ferro e de madeira. “No modelo convencional gastaria R$ 3 mil, mas esse me custou R$ 800”, relata. Pedaços de postes e pneus também são usados na contenção do terreno. Carretéis de metal serviram de base para a varanda, que é a própria estrutura da casa. A energia solar terá um captador tradicional e um novo modelo que, juntos, vão economizar 92% de energia elétrica. A estrutura da laje são janelas descartadas por um shopping. “Catei R$ 18 mil do lixo, valor que gastaria na compra de ferro”, afirma.

A entrada da sala de estar é surpreendente: as portas são de um caminhão que capotou na estrada. O tanque é de material reciclado de pó de mármore e resina. O fogão a lenha, o forno e a lareira estão em um único equipamento: um cilindro de ar comprimido da antiga rede ferroviária. Os armários são de madeira de demolição e o piso também é fruto das cruzetas de postes de luz. Uma mistura de plástico com serragem de madeira será usada no lugar das pedras das pias. “Gastei R$ 550 por metro quadrado num casa com excelente nível de acabamento, que me custaria R$ 1,4 mil no modo convencional”, destaca. Além do custo, o propósito maior do trabalho é levado em conta: “Quando ocorrem tragédias como as enchentes da semana passada não entendemos por quê. É simples. Se não pararmos de jogar lixo na rua não haverá perdão, a natureza vai cobrar”.

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